quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Os 30 Anos de Super Trouper

Em 3 de novembro de 1980, o sétimo álbum de estúdio do ABBA chegou às lojas de discos em sua Suécia natal e posteriormente no resto do mundo. Este foi, talvez, o menos complicado e o mais honesto álbum que o grupo já fez. Há nele uma sensação de limpidez que envolve a sua concepção. Em janeiro, Björn e Benny fizeram uma viagem altamente produtiva em termos de composição a Barbados, voltando com nada menos do que cinco músicas. No dia 4 de fevereiro as sessões de gravação começaram no estúdio Polar Music, e até meados de outubro o trabalho foi concluído. A única interrupção, além das férias, constou de uma viagem de duas semanas ao Japão em março, mas o empreendimento baseou-se na turnê do outono pela América do Norte e Europa, e foi relativamente fácil de concluí-la. As sessões do Super Trouper contrastaram com os 12 meses do período de gestação do álbum anterior, Voulez-Vous, em que Björn e Benny descartaram muitas canções em vários estágios de acabamento, o estúdio de gravação do ABBA, Polar Music Studios, foi inaugurado alguns meses após o início das sessões, Agnetha e Björn decidiram terminar o seu casamento no meio da produção e a data de lançamento do álbum foi continuamente adiada.

Portanto vamos analisar como o álbum Super Trouper evoluiu, canção por canção. O tom de maturidade, calma e facilidade foi definido pela primeira canção composta em Barbados a ser gravada: "Andante, Andante", uma balada romântica com Frida sobre a consumação do ato amoroso, falado metaforicamente através de instruções musicais. O grupo depois prosseguiu com o sintetizador em "Elaine", no fim das contas destinada a ser o lado B do single "The Winnter Takes It All". A terceira música foi "The Piper", em que o compositor Björn adentrou em um assunto que tinha sido bastante incomum para o ABBA até aquele momento. Inspirado no romance de Stephen King, "The Stand", ele escreveu uma letra sobre a ascensão de um líder carismático do tipo fascista nos moldes de Adolph Hitler. "A letra lida com o medo que ali chegará um momento em que essas pessoas vão querer um novo líder", explicou depois Björn. Assuntos relacionados à política seriam ainda mais frequentes no último álbum do ABBA, "The Visitors", em que a Guerra Fria teria inspirado de modo patente pelo menos duas canções.

Em seguida, no cronograma de gravações do ABBA havia uma canção que originalmente estava destinada a fazer parte de um musical. Durante muitos anos, Benny e Björn haviam sonhando em se expadir para o mundo musical, que não pode ser limitado pelos parâmetros de um álbum de 10 músicas, mas criar um drama musical com um enredo, onde se possa expandir a sua paleta musical. No avião sobrevoando Barbados eles tiveram a ideia de escrever um musical que se passaria em um réveillon. Benny lembra, "Nós achávamos que seria um bom quadro: algumas pessoas em uma sala, olhando para o passado, pensando no futuro, esse tipo de coisa." Em Barbados eles tiveram um encontro com John Cleese - de Monty Python e Fawlty Towers - e no jantar propuseram-lhe escrever o livro para o musical. Infelizmente, Cleese não estava muito interessado nessa perspectiva e o que permaneceu da ideia foi uma canção com temática de Ano Novo: "Happy New Year".

Alguns dias depois o ABBA gravou "On and On and On", notável pela inclusão de alguns vocais em falsete no estilo Beach Boys, cortesia de Benny e que lembrava muito o sucesso dos seus ídolos em 1968 "Do It Again". Os arranjos chamaram a atenção de Mike Love, um dos Beach Boys, que gravou um cover apagado da música para o seu álbum solo de 1981, "Looking Back With Love". A versão completa de "On and On and On" foi editada na época de seu lançamento, sendo utilizada apenas no clipe oficial ainda em 1980. Essa versão com versos adicionais foi disponibilizada em áudio pela primeira vez no box The Complete Studio Recordings, em 2005.

Após a conclusão da faixa de apoio para mais uma canção - a agitada "On and On and On" - o ABBA deixou o estúdio de gravação por quase dois meses para ensaiar e em seguida realizar a sua turnê de duas semanas pelo Japão. Esses shows não constituem apenas os últimos concertos ao vivo em solo estrangeiro, como também diante de uma plateia pagante em salas de concertos "regulares". A última apresentação ao vivo do grupo aconteceu um ano depois em um estúdio de televisão sueco, como parte do especial "Dick Cavett Meets ABBA".

Com o retorno aos estúdios da Polar Music no dia 9 de abril, o resto do mês foi então passado em gravações de vocais e a mixagem de cinco faixas já concluídas. Após mais uma pausa no estúdio de gravação em maio, o ABBA em seguida retornou no dia 2 de junho com três novas músicas a serem trabalhadas. Muitos concordam que a primeira delas foi a melhor gravação do ABBA: "The Winner Takes It All" estava destinada a se tornar um verdadeiro clássico na história do banda. Quando as sessões foram iniciadas no dia 2 de junho, a melodia levava o título provisório "The Story Of My Life" e foi a primeira das novas peças a serem gravadas. Mesmo na fase escrita, sentados frente a frente, Benny ao piano e Björn com o seu violão, eles sentiram que estavam com algo especial. A primeira tentativa de uma faixa de apoio foi um arranjo uptempo com uma batida regular e insistente. Soava bem, mas os compositores sentiram que não era exatamente o que eles estavam procurando. Benny recorda a faixa como "muito dura e métrica". Ao ouvirem uma mixagem das gravações no carro no caminho de volta para casa, eles decidiram tentar de novo. "Sentimos que era uma canção muito importante e queríamos ter certeza de que não a perderíamos", lembra Björn. Eles deixaram a canção parada por alguns dias.

Quatro dias depois, em 6 de junho, Björn e Benny estavam de volta ao estúdio com os músicos para uma nova tentativa. Benny deu a chave para o novo arranjo quando apareceu com uma "chanson-style", com piano decrescente, afrouxando consideravelmente a estrutura da canção e dando um melhor fluxo. Como uma demonstração para o seu novo arranjo, Björn incluiu uma faixa vocal em francês sem sentido. Alguém até comentou que esta nova canção talvez pudesse ser apresentada pelo próprio compositor. "É uma coisa boa que eu não fiz", ele suspirou depois, muito aliviado por ter evitado tão pouco discernimento. Essa canção que claramente pedia para ser cantada por cantoras profissionais como as garotas. Como era o seu hábito nesta fase da carreira do ABBA, Björn foi para casa com uma fita da música de fundo a fim de escrever as letras. "Eu queria que houvesse algum tipo de ambiente na gravação", lembra ele, "porque então eu teria uma imagem mais clara do que a canção 'diria'. Havia mais satisfação nisso do que ouvir uma fita comigo ao violão e Benny distante ao piano."

As camadas da "chanson" francesa no arranjo sugeriram algo que dava um toque melodramático: sentimentos fortes sobre um assunto emocional. Nesta noite especial Björn abriu uma garrafa de uísque e bebeu livremente durante o processo de composição. O álcool subiu à sua cabeça e alimentou a sua criatividade, esta foi a letra mais rápida que ele compôs e também uma das melhores. "Eu estava bêbado", ele relembra,"e toda a letra chegou a mim em uma onda de emoção em uma hora. E isso nunca funciona. Você acha que é maravilhoso na hora, mas parece terrível no dia seguinte, mas algo deu certo". Quando ele concluiu havia surgido a letra de "The Winner Takes It All". A letra falava sobre o rompimento de um relacionamento, o tema que Björn sempre destacou durante os seus anos com o ABBA. Ele admite livremente que o sofrimento causado pelo rompimento com Agnetha inspirou "The Winner Takes It All"', embora não signifique que as palavras devam ser tomadas literalmente. "Nem eu e nem Agnetha fomos vencedores no nosso divórcio", ressaltou. Qualquer pessoa que queira uma lição de estrutura de canção pop, e uma quase perfeita mistura de música, letra, arranjo e performance vocal, não precisa olhar mais longe do que para esta gravação.

"Como uma melodia, é a mais simples de todas", Benny comentou. "Existem apenas duas linhas melódicas diferentes que se repetem durante toda a música, e ainda assim acho que nós conseguimos evitar uma sensação de repetição". Isto foi conseguido através de variações limitadas das palavras em sua concepção, constrastando mudanças na letra e na melodia com constantes mudanças no arranjo. Após a breve introdução, o primeiro verso dá o tom declarando: "I don't wanna talk/About the things we've gone through", acompanhado apenas por piano e violão, tocando suavemente no fundo. Em seguida, depois do primeiro refrão, o pontapé completo com a protagonista relembrando a sua história no passado ("I was in your arms/Thinking I belonged there"). Um cescendo emocional no segundo coro é seguido por uma atitude reflexiva, desacelerado no terceiro verso - ainda com o baixo e a bateria conduzindo a música - onde a cantora questiona a validade do novo relacionamento do seu ex-amante. No quarto verso, a canção é trazida de volta ao presente e ao tom da declaração de abertura, acompanhado apenas por piano e violão hesitantes, antes de criar a fase mais dinâmica da canção inteira: a explosão de emoções inteiramente dispostas no refrão final. Era como canção e gravação que tinham realmente evoluído a partir do coração, e todos os que já a ouviram teriam este sentimento nos anos que viriam. Lançado como o primeiro single do álbum em julho de 1980, "The Winner Takes It All" foi um sucesso imediato, garantindo as melhores posições nas paradas do mundo inteiro.

Durante o mesmo período de gravações, Frida também triunfou com seu desempenho vocal saudoso em "Our Last Summer", novamente com uma letra altamente pessoal inspirada em um romance que Björn teve na adolescência em Paris duas décadas antes. Infelizmente essa faixa nunca foi lançada como single, mas se tornou mais conhecida nos últimos anos com a sua inclusão no musical Mamma Mia!. "É o tipo de lembrança melancólica do último verão da inocência", relembra Björn.

Estas primeiras sessões de junho também viram a gravação de "Burning My Bridges", a primeira canção da era Super Trouper a permanecer inédita. No entanto, um trecho foi incluído mais tarde no medley "ABBA Undeleted", lançado pela primeira vez em 1994 no box "Thank You for the Music". Parte do seu refrão havia sida utilizada em Hamlet III e mais tarde em Lotties Schottis, no álbum solo de Benny Andersson.

Após uma pausa no verão, o ABBA voltou ao estúdio no dia 8 de setembro com três novas canções. O solo de Frida "Me and I" caracterizou mais uma vez uma letra incomun, em que Björn explorou o conflito dos vários lados que habitam em uma mesma pessoa, seu tema era a dupla personalidade - "I am to myself what Jekyll must have been to Hyde" - combinada com a entrega forçada de Frida colocada em um bem vindo rodopio escuro no universo em grande parte brilhante e saudável do ABBA. Enquanto isso, Agnetha também transformou outra performance vocal de mágoa devastadora na faixa eletro-disco "Lay All Your Love On Me", que teve um lançamento limitado em alguns países como single de 12 polegadas em 1981.

A terceira canção gravada durante essas sessões de setembro estava destinada a permanecer inédita por mais de uma década. A inspirada no México "Put On Your White Sombrero" apresentou magnificamente um vocal apaixonado de Frida e harmonia deslumbrante dos vocais de ambas as garotas, mas por alguma razão o grupo se sentiu desconfortável com a música e decidiu não inclui-la no álbum. Os arranjos foram aproveitados dois depois em "Cassandra" e quatorze anos mais tarde a faixa foi um dos destaques entre as canções inéditas do box "Thank You for the Music".

Com a inclusão de uma gravação ao vivo no Wembley Arena, "The Way Old Friends Do", no início de outubro o ABBA tinha nove canções alinhadas para o seu novo álbum. Havia sido decidido também que o novo álbum seria intittulado "Super Trouper", nomeado após os grandes holofotes utilizados nas turnês em estádios. Mas eles sentiram que uma décima canção era necessária, de preferência algo que pudesse funcionar como um novo single também. Depois de alguns dias de composição agitados no estúdio, Björn e Benny chegaram a uma canção perfeita - e, por um golpe de sorte, o título "Super Trouper" coube perfeitamente também. Um novo single e a faixa título para o novo álbum, tudo estava perfeito. Frida foi escolhida como vocalista principal em "Super Trouper" e o grupo foi recompensado com mais um single de sucesso mundial.

Super Trouper (o álbum) também foi extremamente bem sucedido, com milhões de cópias vendidas em pré-venda, tornou-se um dos álbuns mais vendidos do ABBA em todos os tempos. Com apenas duas músicas descartadas durante todo o período de composição e gravação, que em si mesmo foi perfeitamente arredondado em apenas um pouco mais de nove meses, Super Trouper deve ter sido o álbum mais suave da carreira do grupo. Havia uma sensação de maturidade, realização e satisfação em torno do álbum. Com o álbum do ano seguinte, "The Visitors", e as sessões abortadas do último álbum em 1982, as coisas seriam menos suaves.

"Super Trouper" foi o sexto álbum do grupo que liderou as paradas no Reino Unido e foi também o álbum mais vendido na Grã-Bretanha em 1980. Super Trouper foi lançado pela primeira vez em CD em 1983 pela Polydor.


Sessões de Gravação (04/02/80 a 14/10/80):

04/02/80
Hold Me Close - título provisório de Andante, Andante.

05/02/80:
Elaine Elaine Elaine - título provisório de Elaine.
Elaine

06/02/80:
Ten Tin Soldiers - título provisório de Sherwood.
Sherwood (instrumental) - título provisório de Äntligen krig.
Äntligen krig (instrumental) - título provisório de The Piper.

11/02/80:
Daddy Don’t Get Drunk On Christmas Day - título provisório de Happy New Year.

12/02/80:
Esses vad det svänger när man spelar jazz - título provisório de 'Til The Night Is Gone.

09/04/80:
Andante, Andante
The Piper
'Til The Night Is Gone - título provisório de On And On And On.
Happy New Year

24/04/80:
On And On And On

02/06/80:
The Story of My Life - título provisório de The Story Of My Life II / III.

03/06/80:
Burning My Bridges

04/06/80:
Our Last Summer

06/06/80:
The Story Of My Life II / III - título provisório de The Winner Takes It All.
The Winner Takes It All

08/09/80:
Jackass - título provisório de Piccolino.
Piccolino - título provisório de Me And I.

09/09/80:
Me And I
Yarrafat - título provisório de Lay All Your Love on Me.
Lay All Your Love On Me
Spansk II (instrumental) - título provisório de Pig Party On Mallorca.
Pig Party On Mallorca - título provisório de Padre.
Padre - título provisório de Put On Your White Sombrero.
Put On Your White Sombrero

03/10/80:
Blinka lilla stjärna - título provisório de Super Trouper.
Super Trouper

08/10/80:
The Way Old Friends Do (overdubs em estúdio)

14/10/80:
Andante, Andante (versão em espanhol)
Felicidad

Paradas:

Reino Unido - #1
Suécia - #1
Noruega - #1
Alemanha - # 1
Holanda - #1
Bélgica - #1
Suíça - #1
México - #1
Argentina - #2
Finlândia - #2
Áustria - #3
Canadá - #4
Espanha - #4
Austrália - #5
Nova Zelândia - #5
Japão - #8
França - #8
Itália - #13
Estados Unidos #17

Singles:

The Winner Takes It All
Reino Unido - #1
Alemanha - #1
Bélgica - #1
Holanda - #1
Irlanda - #1
Costa Rica - #1
África do Sul - #1
Suécia - #2
Finlândia - #2
Noruega - #3
Áustria - #3
Noruega - #3
Suíça - #3
França - #5
México - #5
Itália - #7
Austrália - #7
Estados Unidos - #8 (Hot 100) e #1 (Adult Contemporany)
Espanha - #10
Canadá - #10
Nova Zelândia - #16
Japão - #33

Super Trouper
Reino Unido - #1
Alemanha - #1
Bélgica - #1
Holanda - #1
Irlanda - #1
Costa Rica - #1
Noruega - #2
Áustria - #3
Suíça - #3
México - #3
França - #4
Finlândia - #5
Espanha - #8
Suécia - #11
Canadá - #32
Estados Unidos - #45 (Hot 100) e #14 (Adult Contemporany)
Austrália - #77
Japão - #93

Lay All Your Love On Me
Estados Unidos - #1 (Club Play Singles)
Alemanha - #5
Reino Unido - #7
Irlanda - #8
Bélgica - #14
França - #18




Fontes: adaptado a partir de artigo publicado em Abbasite e trechos do livro The Complete Recordings Sessions de Carl Magnus Palm, fotos Raffem e Abba Omnibus.

1 comments:

Renata disse...

Eu quero ! Eu quero! Eu quero!
Pô, quando é que vai sair esse bendito disco no Brasil? Minha graninha já tá guardada!

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