segunda-feira, 27 de julho de 2015

Coletâneas brasileiras do ABBA


Coletâneas sempre estiveram nos tópicos mais discutidos entre os fãs de um grupo musical ou cantor(a). Para quem apenas aprecia uma banda, a coletânea é mais do que suficiente. Para os fãs e colecionadores, ela pode representar um pouco mais do que apenas um apanhado de hits.


A começar pelo questionamento do que seja um hit (sucesso): para fãs apaixonados, o conceito de hit é bem diferente do que seria para alguém que simplesmente gosta de determinado artista, mas não é necessariamente fã nem colecionador.

No caso do ABBA, o grupo explodiu em 1974, com a vitória de Waterloo no Eurovision Song Contest. No Brasil, o nome do ABBA só começou a aparecer nas paradas de sucesso e nas lojas de discos a partir de 1976, quando Fernando estourou mundialmente e ganhou até versão em português da cantora paraguaia Perla.

À direita, Fernando do ABBA e, à esquerda, Fernando da Perla, compactos de 1976
Tanto que o primeiro álbum do ABBA lançado no Brasil foi uma coletânea "disfarçada". Como os dois primeiros - Ring Ring (1973) e Waterloo (1974) - não haviam sido lançados aqui, a RCA reuniu os hits desses dois LPs e juntou com outros hits pescados do terceiro LP, ABBA (1975), usando a arte gráfica do último disco. E assim surgiu o álbum ABBA no Brasil, em 1976, bem no auge do sucesso de Fernando (faixa que também foi incluída na edição brasilera, mas que não faz parte do álbum original). 


A lista de canções era a mesma da coletânea Greatest Hits (1976), lançada no resto do mundo, com exceção de He Is Your Brother, que não entrou no LP brasileiro. [Para mais detalhes sobre a edição brasileira do álbum ABBA (1975), leia aqui o post que fiz há alguns anos].



A primeira coletânea "de verdade" do ABBA no Brasil foi Disco de Ouro, lançada pela RCA em 1978. A faixa Watch Out, que fazia parte do álbum Waterloo, mas que não havia sido lançada em nenhum LP do ABBA no Brasil, foi incluída no Disco de Ouro, apesar de não ter sido um hit. A canção tinha aparecido pela primeira vez aqui em 1977, na coletânea (também da RCA) Discoteca Tropicana, um apanhado de músicas que faziam sucesso nas pistas de dança brasileiras da época. Talvez uma aposta da RCA, quando o ABBA ainda buscava uma identidade entre o rock e pop, pouco antes de se firmar como grupo genuinamente pop.


Em 1980, a RCA lançou no Brasil o LP Greatest Hits, que na verdade era uma versão adaptada de Greatest Hits Vol. 2 (1979), com lista de músicas diferente do resto do mundo, incluindo algumas e suprimindo outras. (Detalhes também no post mencionado acima.) 

A Som Livre se antecipou em 1981 e lançou a coletânea ABBA 10 Anos, pegando carona no enorme sucesso que o ABBA fazia no Brasil (àquela altura, o grupo já era bem popular no mundo todo). No entanto, para que as 14 faixas coubessem no LP, algumas foram editadas. (Alguns fãs abominam, outros consideram uma "exclusividade".)



Em 1983, novamente a Som Livre lançou outra coletânea, Golden Hits, desta vez com uma seleção de faixas bem menos famosas que as da coletânea anterior, que ainda era muito recente. Músicas do começo da carreira do ABBA, como Ring Ring, Dance (While The Music Still Goes On) e So Long foram colocadas junto com as últimas canções do grupo, como Under Attack e The Day Before You Came. A mistura ficou um pouco heterogênea demais, mas ao menos foi a primeira vez que Rock Me fez parte de um LP do ABBA no Brasil (antes ela só havia aparecido aqui em um compacto duplo de 1975).



Ainda em 1983, a RCA lançou sua última coletânea brasileira do ABBA: Super Três - Disco de Ouro. O nome fazia parte da coleção Super Três: Talento - Produto - Qualidade, que incluía coletâneas de artistas brasileiros e seleções de hits internacionais. O mais estranho é que naquele mesmo ano a RCA já havia lançado a edição brasileira da coletânea dupla The Singles - The First Ten Years, que trazia todos os grandes hits do ABBA. Ou seja: qual o propósito de lançar o ABBA na Super Três também? De qualquer forma, este LP é hoje a coletânea brasileira do ABBA mais rara, bem difícil de ser encontrada, o que faz dela um item de colecionador.



Com isso, houve um espaço de cinco anos até que outra coletânea brasileira do grupo fosse lançada: ABBA - Os Grandes Sucessos (1988), da Som Livre. Foi a última coletânea brasileira do ABBA, lançada numa época em que o grupo já era considerado 'coisa do passado'. 



Ainda levaria mais cinco anos até que o Brasil visse outra coletânea do grupo, a mundialmente famosa ABBA Gold, que a Globo/Polydor lançou no mercado brasileiro em 1993. O resto é história: o ABBA voltou às paradas de sucesso do mundo inteiro e passou a ser reverenciado por uma nova geração de fãs e artistas. E teve início uma onda de coletâneas "caça-níqueis", que serão o assunto do próximo post.

sexta-feira, 10 de julho de 2015

ABBA nas coleções do Reader's Digest

A revista americana Reader's Digest (no Brasil, Seleções), publicada em 35 línguas e distribuída em 120 países, foi, durante décadas, muito popular no mundo todo. Até hoje ela sobrevive bravamente nas bancas, com seus artigos, relatos, piadas e histórias. As variadas coleções de produtos lançados pela revista (romances, enciclopédias e discos) marcaram época. O ABBA não ficou de fora. 



Nos anos 80 e 90, o quarteto teve álbuns lançados sob o selo da Reader's Digest. Pelo menos duas caixas, lançadas na Europa, ficaram famosas: The Best Of ABBA - Reader's Digest (com 4 LPs, 1982), em Portugal, e uma versão maior, com 5 LPs, lançada na Grã-Bretanha. Eram vendidas em condições especiais para assinantes da revista e são, hoje, itens raros de colecionador. Anos depois, variações em K-7 e CD foram lançadas, além de outras coletâneas menores.

A versão portuguesa (4 LPs) e a versão britânica (5 LPs)
Em termos de novidade musical, as caixas do ABBA lançadas pela Reader's Digest não trouxeram nada de diferente. A vasta lista de músicas incluiu tanto os grandes sucessos quanto faixas menos conhecidas do grande público. Mas a embalagem era caprichada, sofisticada e bonita, bem ao estilo das coleções de LPs da revista.

Já no final dos anos 80 e começo dos 90, quando o compact disc chegou com tudo, a Reader's Digest lançou outras compilações do ABBA em CD. Muitos podem se questionar sobre o motivo de oferecer coletâneas tão parecidas em um espaço de tempo relativamente curto.

As razões variam bastante. Algumas vezes isso se dá por questões contratuais, outras por senso de oportunidade, como quando um selo adquire os direitos de lançamento de determinado catálogo musical. Outras vezes pode ser a tentativa de pegar carona em uma fase boa do artista, ou então o contrário, o cantor/grupo está meio sumido e a gravadora quer fazer um revival etc. Mas existe a velha razão, com a qual o mercado de discos ainda conta: muitos fãs se sentem tentados a comprar todas as coletâneas que aparecem, mesmo que elas não tragam nenhuma música inédita. Seja pelo layout da capa, pelo encarte, por uma faixa editada ou por alguma outra peculiaridade que represente um atrativo para um fã. Isso acaba gerando burburinho e estimulando o "colecionismo" entre eles.

Na seção "Discografia selecionada", do livro Mamma Mia!, questiono brevemente essa necessidade constante de novas coletâneas quando falo de ABBA - The Definitive Collection (2001):

Os nomes de coletâneas sempre falam em superlativos: "Greatest", "Best", "Very Best". Mas é um tanto quanto difícil justificar o lançamento de mais esta coletânea depois do sucesso esmagador de ABBA Gold e More ABBA Gold. (Mamma Mia!, Panda Books, 2011).

As pomposas coletâneas da Reader's Digest são apenas um exemplo desse nicho de mercado, por vezes repetitivo. Na história de sucesso do ABBA, existem vários outros exemplos de compilações com hits do grupo, mesmo que em muitos casos os álbuns misturem meia dúzia de sucessos com uma dezena de faixas menos expressivas. Para agradar ao fã, os organizadores de coletâneas buscam incluir ao menos uma ou duas canções "diferentes". Pode ser uma versão ao vivo, estendida, remixada ou até em outra língua. Qualquer dessas opções é válida para dar um certo ar de "novidade". Mas este é um assunto para os próximos posts.

Algumas das caixas e coletâneas famosas da Reader's Digest:

The Best of ABBA (Portugal, 1982)


The Best of ABBA (UK, 1982)



Versão em K-7 de The Best of ABBA (UK, 1982)

The Very Best of ABBA (UK, 1989)





The ABBA Collection (França, 1992)
The ABBA Collection (Alermanha, 1992)
The Ultimate Collection (UK, 2003)

The ABBA Collection (Canadá, 1992)
The ABBA Collection em K-7 (Austrália, 1993)


quinta-feira, 2 de julho de 2015

ABBA ao vivo, 35 anos depois

Que o ABBA nunca gostou de fazer turnês não é novidade para nenhum fã da banda. O negócio do grupo era mesmo o trabalho em estúdio, o processo de criação, composição e gravação das canções. Mas, durante os quase 10 anos em que esteve na ativa, o ABBA fez algumas turnês, sem nunca se preocupar muito com o lançamento de faixas ao vivo. Tanto que o primeiro álbum ao vivo só foi lançado anos depois do término da banda.



Uma das razões que Björn cita para essa relutância do grupo em fazer turnês é o perfeccionismo. Na opinião dele, a perfeição que ele e Benny sempre buscaram em estúdio era impossível de ser obtida no palco. Pode até ser, mas isso não diminui a curiosidade dos fãs em ouvir versões ao vivo. Aliás, elas não são perfeitas como as originais, mas a emoção e o entusiasmo do grupo compensam.

Em 1986, quando ABBA Live - primeiro disco "ao vivo" do quarteto - foi lançado, não causou impacto. Os tempos eram outros. O grupo já havia ficado no passado e seus ex-integrantes estavam envolvidos em trabalhos solo, bem distantes do ABBA.



ABBA Live é uma compilação de 15 canções gravadas ao vivo, durante a turnê de 1977 na Austrália, a turnê de 1979 em Londres, na Wembley Arena, e o especial de TV Dick Cavett Meets ABBA, de 1981. As canções foram costuradas pelas palmas e gritos da platéia, de modo que todas parecessem ter feito parte de um só show. "Eu particularmente detesto álbuns ao vivo", disse Björn. “É chato escutar 'reproduções' de músicas que soam muito melhores no estúdio... Mas as fitas estavam OK, aí apenas dissemos ‘Vão em frente e lancem então’. Não havia nada do que se envergonhar.”

Nenhum dos membros do ABBA se entusiasmaram com o projeto e, de fato, permaneceram indiferentes. A falta de interesse do mercado foi recíproca. O álbum foi lançado simultaneamente em CD e LP e, apesar de ter suprido a carência de material ao vivo da banda, Michael Tretow (engenheiro de som do ABBA) não gosta do ABBA Live. As canções receberam muito tratamento posterior em estúdio, para aumento da qualidade, e isso deu um ar frio às músicas, que perderam o sentimento de proximidade presente nos shows.

Com o passar dos anos e o crescente interesse pelo trabalho do grupo, a atitude geral em relação ao ABBA foi mudando gradualmente. Se nos anos 80, quando Live foi lançado, a moda era esnobar o ABBA, nos anos 2000 a atitude já era bem diferente. Após o reconhecimento do talento e da maestria do quarteto no cenário pop, principalmente depois do imenso sucesso mundial do musical Mamma Mia!, um álbum ao vivo do ABBA não parecia mais uma ideia sem interesse.

Em 2014, essa lacuna foi preenchida com o lançamento em CD e vinil de ABBA Live at Wembley Arena, um show inteiro do grupo, totalizando 25 faixas. A surpresa foi parte da comemoração dos 40 anos do ABBA, ano passado. E, de quebra, uma composição inédita de Agnetha, I'm Still Alive, que nunca havia sido oficialmente lançada, está entre as faixas gravadas ao vivo. Para quem nunca teve a chance de ver uma apresentação do grupo, o álbum é uma experiência rica. É a reprodução, na íntegra, de uma das noites em que o grupo tocou na Wembley Arena, em Londres, em novembro de 1979.



Björn garantiu que nenhuma correção foi feita para alterar o som do palco. Está tudo ali, do jeito que aconteceu durante o show, para que o público de hoje, ao ouvir, tenha uma noção exata de como soava um show ao vivo do ABBA. Chris Charlesworth, editor da Omnibus Press, que publicou o livro Bright Lights Dark Shadows - The Real Story Of ABBA, de Carl Magnus Palm, analisa: "Tocar seis noites seguidas em Wembley, naquela época, não era moleza. Não consigo me lembrar de outro artista que tenha feito tantos shows consecutivos naquele tempo. E na plateia estavam presentes, durante aquelas noites, roqueiros que já reconheciam que o ABBA devia ser levado a sério: membros do Led Zeppelin, Deep Purple e Moody Blues, para citar alguns. Até hipsters como Joe Strummer [vocalista e guitarrista da banda The Clash] foram vistos na area VIP dos shows do ABBA em Wembley."



Um fato interessante desse lançamento do ano passado: o produtor do Live at Wembley foi ninguém menos que Ludwig Andersson, 33 anos, filho de Benny. Ele explicou como encarou essa divertida – porém árdua – missão: "É uma coisa bem difícil de se fazer. Escutar seis shows idênticos, de seis noites diferentes, porque ele são iguais, de várias maneiras. E depois de um tempo você acaba se perguntando se seu julgamento está correto – quem pode dizer qual é melhor que o outro? Então procurei basear meu julgamento no meu feeling."




"Minha ideia era que seria bacana mostrar o registro de uma noite de show do ABBA, na íntegra, para todos que não estiveram lá", explica Ludwig. E ele se inclui nessa turma. "Fiz isso por mim", porque eu não era nascido naquele tempo. Então nunca cheguei a ter acesso a isso. Por isso fiz tudo para poder ouvir o material ao vivo como ele foi apresentado naquela época."

Uma pergunta curiosa: será que Ludwig passou por uma fase na adolescência em que chegou a odiar a música de seu pai? A resposta foi dada ao repvrter Craig McLean, do jornal inglês The Telegraph, a quem Ludwig concedeu a entrevista: "Não!", respondeu ele, bem-humorado. "Nunca senti nada do tipo ‘oh, meu pai faz uma coisa diferente do que fazem os outros pais, que saem para o trabalho e voltam à noite.’ Meu pai ia para o estúdio e os pais dos meus amigos iam para o escritório."

Ludwig e o pai Benny Andersson
Valeu a pena esperar 35 anos para que esse album fosse lançado. Mais do que a prova de que o ABBA tinha, de fato, energia para animar uma plateia ao vivo, Live at Wembley Arena é um registro histórico e fiel de uma época em que o ABBA reinava como o grande grupo pop da década de 1970.


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