Que o ABBA nunca gostou de fazer turnês não é novidade para nenhum fã da banda. O negócio do grupo era mesmo o trabalho em estúdio, o processo de criação, composição e gravação das canções. Mas, durante os quase 10 anos em que esteve na ativa, o ABBA fez algumas turnês, sem nunca se preocupar muito com o lançamento de faixas ao vivo. Tanto que o primeiro álbum ao vivo só foi lançado anos depois do término da banda.
Uma das razões que Björn cita para essa relutância do grupo em fazer turnês é o perfeccionismo. Na opinião dele, a perfeição que ele e Benny sempre buscaram em estúdio era impossível de ser obtida no palco. Pode até ser, mas isso não diminui a curiosidade dos fãs em ouvir versões ao vivo. Aliás, elas não são perfeitas como as originais, mas a emoção e o entusiasmo do grupo compensam.
Em 1986, quando ABBA Live - primeiro disco "ao vivo" do quarteto - foi lançado, não causou impacto. Os tempos eram outros. O grupo já havia ficado no passado e seus ex-integrantes estavam envolvidos em trabalhos solo, bem distantes do ABBA.
ABBA Live é uma compilação de 15 canções gravadas ao vivo, durante a turnê de 1977 na Austrália, a turnê de 1979 em Londres, na Wembley Arena, e o especial de TV Dick Cavett Meets ABBA, de 1981. As canções foram costuradas pelas palmas e gritos da platéia, de modo que todas parecessem ter feito parte de um só show. "Eu particularmente detesto álbuns ao vivo", disse Björn. “É chato escutar 'reproduções' de músicas que soam muito melhores no estúdio... Mas as fitas estavam OK, aí apenas dissemos ‘Vão em frente e lancem então’. Não havia nada do que se envergonhar.”
Nenhum dos membros do ABBA se entusiasmaram com o projeto e, de fato, permaneceram indiferentes. A falta de interesse do mercado foi recíproca. O álbum foi lançado simultaneamente em CD e LP e, apesar de ter suprido a carência de material ao vivo da banda, Michael Tretow (engenheiro de som do ABBA) não gosta do ABBA Live. As canções receberam muito tratamento posterior em estúdio, para aumento da qualidade, e isso deu um ar frio às músicas, que perderam o sentimento de proximidade presente nos shows.
Com o passar dos anos e o crescente interesse pelo trabalho do grupo, a atitude geral em relação ao ABBA foi mudando gradualmente. Se nos anos 80, quando Live foi lançado, a moda era esnobar o ABBA, nos anos 2000 a atitude já era bem diferente. Após o reconhecimento do talento e da maestria do quarteto no cenário pop, principalmente depois do imenso sucesso mundial do musical Mamma Mia!, um álbum ao vivo do ABBA não parecia mais uma ideia sem interesse.
Em 2014, essa lacuna foi preenchida com o lançamento em CD e vinil de ABBA Live at Wembley Arena, um show inteiro do grupo, totalizando 25 faixas. A surpresa foi parte da comemoração dos 40 anos do ABBA, ano passado. E, de quebra, uma composição inédita de Agnetha, I'm Still Alive, que nunca havia sido oficialmente lançada, está entre as faixas gravadas ao vivo. Para quem nunca teve a chance de ver uma apresentação do grupo, o álbum é uma experiência rica. É a reprodução, na íntegra, de uma das noites em que o grupo tocou na Wembley Arena, em Londres, em novembro de 1979.
Björn garantiu que nenhuma correção foi feita para alterar o som do palco. Está tudo ali, do jeito que aconteceu durante o show, para que o público de hoje, ao ouvir, tenha uma noção exata de como soava um show ao vivo do ABBA. Chris Charlesworth, editor da Omnibus Press, que publicou o livro Bright Lights Dark Shadows - The Real Story Of ABBA, de Carl Magnus Palm, analisa: "Tocar seis noites seguidas em Wembley, naquela época, não era moleza. Não consigo me lembrar de outro artista que tenha feito tantos shows consecutivos naquele tempo. E na plateia estavam presentes, durante aquelas noites, roqueiros que já reconheciam que o ABBA devia ser levado a sério: membros do Led Zeppelin, Deep Purple e Moody Blues, para citar alguns. Até hipsters como Joe Strummer [vocalista e guitarrista da banda The Clash] foram vistos na area VIP dos shows do ABBA em Wembley."
Um fato interessante desse lançamento do ano passado: o produtor do Live at Wembley foi ninguém menos que Ludwig Andersson, 33 anos, filho de Benny. Ele explicou como encarou essa divertida – porém árdua – missão: "É uma coisa bem difícil de se fazer. Escutar seis shows idênticos, de seis noites diferentes, porque ele são iguais, de várias maneiras. E depois de um tempo você acaba se perguntando se seu julgamento está correto – quem pode dizer qual é melhor que o outro? Então procurei basear meu julgamento no meu feeling."
"Minha ideia era que seria bacana mostrar o registro de uma noite de show do ABBA, na íntegra, para todos que não estiveram lá", explica Ludwig. E ele se inclui nessa turma. "Fiz isso por mim", porque eu não era nascido naquele tempo. Então nunca cheguei a ter acesso a isso. Por isso fiz tudo para poder ouvir o material ao vivo como ele foi apresentado naquela época."
Uma pergunta curiosa: será que Ludwig passou por uma fase na adolescência em que chegou a odiar a música de seu pai? A resposta foi dada ao repvrter Craig McLean, do jornal inglês The Telegraph, a quem Ludwig concedeu a entrevista: "Não!", respondeu ele, bem-humorado. "Nunca senti nada do tipo ‘oh, meu pai faz uma coisa diferente do que fazem os outros pais, que saem para o trabalho e voltam à noite.’ Meu pai ia para o estúdio e os pais dos meus amigos iam para o escritório."
Ludwig e o pai Benny Andersson |
Valeu a pena esperar 35 anos para que esse album fosse lançado. Mais do que a prova de que o ABBA tinha, de fato, energia para animar uma plateia ao vivo, Live at Wembley Arena é um registro histórico e fiel de uma época em que o ABBA reinava como o grande grupo pop da década de 1970.
1 comments:
Amei este CD de músicas ao vivo do ABBA. Uma coisa que estranhei é o fato do grupo não ter cantando a música "Mamma Mia" no show, sendo que na época já era reconhecida como um hit consagrado.
Postar um comentário